Tinta vermelha – Alberto Siufi

O primeiro contato que tive com o filósofo Slavoj Zizek foi com uma frase sua que dizia: “O botão que aciona a porta dos elevadores é um placebo destinado a dar ilusão a quem o aperta de que participa do movimento do aparelho”. Já tinha achado interessante. Agora, num pronunciamento em Nova Iorque para falar ao acampamento de manifestantes do movimento Occupy Wall Street (Ocupe Wall Street) termina seu discurso de forma brilhante.

“Agora em Em uma velha piada da antiga República Democrática Alemã, um trabalhador alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que todas as suas correspondências serão lidas pelos censores, ele diz para os amigos: “Vamos combinar um código: se vocês receberem uma carta minha escrita com tinta azul, ela é verdadeira; se a tinta for vermelha, é falsa”. Depois de um mês, os amigos receberam a primeira carta, escrita em azul: “Tudo é uma maravilha por aqui: os estoques estão cheios, a comida é abundante, os apartamentos são amplos e aquecidos, os cinemas exibem filmes ocidentais, há mulheres lindas prontas para um romance – a única coisa que não temos é tinta vermelha.” E essa situação, não é a mesma que vivemos até hoje? Temos toda a liberdade que desejamos – a única coisa que falta é a “tinta vermelha”: nós nos “sentimos livres” porque somos desprovidos da linguagem para articular nossa falta de liberdade. O que a falta de tinta vermelha significa é que, hoje, todos os principais termos que usamos para designar o conflito atual – “guerra ao terror”, “democracia e liberdade”, “direitos humanos” etc. etc. – são termos FALSOS que mistificam nossa percepção da situação em vez de permitir que pensemos nela. Você, que está aqui presente, está dando a todos nós tinta vermelha.”

Slavoj Zizek

http://blogs.estadao.com.br/link/web-ocupada/ – LINK (Estadão) 17/10/2011

Nenhum comentário: